domingo, 14 de junho de 2015
sábado, 13 de junho de 2015
OMISSÃO
Li no jornal
Que dezesseis ianomâmis
Foram chacinados
No mesmo dia em que à noite
Alguns meninos foram executados
Na mesma semana em que numa favela
Moradores foram assassinados
No mesmo mês em que o New York Times
Noticiou nossos bosques incendiados
Na mesma hora em que neguei três vezes
A um menino, alguns trocados.
COLETIVO
Noite dessas entrei
Em um ônibus lotado
Pessoas, marmitas,
Mochilas por todo lado
Cansaço e melancolia
Nos olhos daquela gente
Era o que se via...
Pensei sobre o assunto
Para escrever poesia
Mas pobreza não dá rima:
Pobreza dá é agonia!
CRÁS
Um beijo de vidro
Atravessa a praça
E se estilhaça
Contra a vidraça.
Desastrevidro
Atrevido
Beijo fatal
Amor tecido
De cristal.
CELESTIA
Estrela
Que estraçalha
O espaço...
Navalha
Fio de aço,
Reluz
No céu
Um açoite...
Enquanto isso
À anos luz
No sul
De um continente
De um planeta azul,
Incontinentes
Os homens se escondem
Com medo da noite.
ARMAGEDON
FELIZ ANIVERBOLO
ANIVERSARIA
OUTRO MILHANO
PLANETERIA.
NÃO FOSSE
O NEANDERTOLO
OGIVORGIA
HOMO LUPUS
BESTA FERA
RUBROTÃO
ATMOSFERIDA.
TÉDIO
A hora...passa
O dia... passa
O mês... passa
O ano... passa
Passa a vida,
Passageiro
Da agonia..
A DIREÇÃO
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Cega seta.
ESTOJO AZUL E BRANCO
Perto de casa havia um armazém que
vendia de tudo. Esses armazéns, conhecidos como “vendas”, eram muito comuns. Lembro
que tinham geralmente um cheiro forte de temperos exóticos, misturados a aromas
mais adocicados. Sobre o balcão, estampavam-se os varais nos quais se
penduravam queijos salames defumados, lingüiças e carne seca. Aos arredores,
sacos de cereais que eram vendidos a granel, pesados e colocados em pequenos
sacos de papel pardo. Também o óleo era vendido em litros, colocados em
garrafas de vidro por meio de uma maquininha que funcionava com uma alavanca
que impulsionava o liquido por um caninho até à abertura da garrafa, desenhando
um espetáculo à parte para os olhos curiosos de criança. No balcão ficavam
expostos os famosos doces de pé-de-moleque, maria-mole, coração-de-abóbora,
canudinho de leite, sem falar nos sonhos e pudins de farinha e leite, os tais
“pudins de padaria”. Só de lembrar desses sabores da infância, minha boca se
enche d’água.
Nas vendas, não havia apenas gêneros
alimentícios, mas também aviamentos, botinas, regadores, enxadas, chapéus, fumo
de corda, canivetes, caldeirões, caçarolas, cortes de fazenda (que era como se
chamavam os tecidos) e artigos de época, entre outras coisas. Tudo na base da
caderneta. A palavra dada valia ouro e o acerto no final do mês era sagrado.
Foi numa dessas vendas que minha mãe
comprou o meu primeiro material escolar. Ainda trago na memória o dia em que
fui com ela para comprá-lo. Um caderno brochura que trazia no verso a letra do
hino nacional e o desenho de nossa bandeira, uma caixinha de seis lápis de cor
com um soldadinho estampado na embalagem alaranjada, um lápis preto, um lápis
vermelho, uma borracha e um apontador. Muito caprichosa, porém, ela ainda comprou
um estojo plástico azul e branco, com tampa sanfonada. Para mim, aquele
material tinha um valor inestimável. Hoje mais ainda, quando penso no quanto
deve ter sido custoso, naqueles dias de poucas posses, ainda mais quando me lembro
da bolsa em forma de pasta, preta, com presilhas prateadas que ela me trouxe da
“cidade”, que era como nos referíamos ao centro comercial.
Lembro disso hoje, quando as
papelarias e hipermercados expõem infinitos modelos de fichários e cadernos
perfumados, acolchoados, com os heróis e ídolos da moda estampados em suas
capas, mochilas dos mais variados modelos, canetas dos mais variados tipos,
lápis de todas as cores, borrachas de todos os formatos, enfim, uma variedade
tão imensa que os olhos até se perdem. Apaixonado que sou por tudo o que possibilite
a escrita e o aprender, penso que seja até saudável que haja tantas opções para
estimular as crianças a irem para a escola. No entanto, fico pensando em
algumas situações que também devem ser levadas em consideração.
Não vou nem discutir os custos
desses materiais diferenciados e a falta de acesso a eles por boa parte das
crianças que freqüentam as escolas públicas, por exemplo, e que dependem do
material doado pelo Estado para continuar freqüentando a escola. Aliás, penso
que o governo não deveria doar materiais e livros aos milhões como tem sido
feito, mas propiciar aos pais dessas crianças a possibilidade de ganho digno
por meio do trabalho para comprarem o que melhor lhes conviesse.
Tudo o que se refere à escola tem que ter, a meu ver, um caráter
educativo, inclusive a compra do material escolar. Lembremo-nos disso e não
percamos a oportunidade de discutir com nossos filhos sobre a importância da
leitura do mundo e, conseqüentemente, do consumo ético e consciente. Valerá a
pena, certamente.
Arnaldo Martinez de Bacco Junior
OS TESOUROS DE MEU TIO
A rua se
chamava Aurora. Sugestivo nome, poético até, para um endereço. Era nessa rua
que ficava a casa de minha tia, irmã de minha mãe, a quem visitávamos
costumeiramente às tardes, durante os dias da semana.
Recordo-me que
havíamos mudado para a cidade há pouco tempo, talvez houvesse uns dois anos. Eu
cursava o primeiro ou segundo ano escolar, não me lembro bem. Minha mãe me
apanhava na saída da escola e íamos lá, para a casa de minha tia que ficava em
uma pequena vila da Rua Aurora, cujo acesso, era um estreito corredor. O portão
de madeira da sua casa ficava bem atrás da primeira curva do tal corredor.
Tia Lourdes fazia
sobremesas preciosas. O cheiro de baunilha que vinha de seus pudins e manjares
e que inundava todo o corredor da pequena vilazinha, ainda passeia por minha
memória olfativa.
Quando não
havia nenhum bolo ou biscoitos caseiros, o que, aliás, era muito raro, eu
acompanhava meu primo até a mercearia da rua de baixo, para comprar bolachinhas
a granel para o café da tarde.
Interessante
notar que em meio a essas saborosas lembranças, aparecem cores. As cores claras
dos móveis da cozinha de minha tia, as cores das paredes e a cor vermelha. Meu
primo havia ganhado um caro de bombeiros do “papai Noel”. Era um carro movido a
pilhas, com suas luzes coloridas e sirene. Um luxo para a época, pois quase
ninguém tinha um brinquedo assim. Pelo menos não entre os meninos que eu
conhecia. Então ele e meu irmão iam brincar no quarto com o carrinho de
bombeiros, fazendo uma algazarra saudável e, nesse momento, extremamente
saudosista. Era nessa hora que meu tio, que era enfermeiro, depois de trabalhar
a noite toda no hospital e de atender seus pacientes particulares, acordava de
seu breve cochilo vespertino. Essa é uma das mais vivas lembranças que tenho
dele. Seu sorriso largo, sua simpatia e sua paciência com toda aquela garotada
a quebrar-lhe o merecido repouso. Meu tio Elcio, guerreiro, sempre trabalhando.
Sempre, incansavelmente.
Então, ele
abria sua estante de portas de vidro, cujo som de seu movimento ainda escuto,
dentro dessas lembranças. A cor vermelha enfim se revela. Não era do carrinho
de meu primo. Era das capas dos livros que ele carinhosamente colocava em
minhas mãos para ver se eu sabia mesmo ler, brincando de desafio para me
incentivar à leitura. Quantas histórias, quanta informação naquelas
enciclopédias que se comprava dos vendedores ambulantes na porta de casa.
Tesouros da Juventude, Trópicos, Estórias Maravilhosas e muito mais. Livros
nunca faltaram na casa de meu tio. Ele dava um imenso valor à leitura e aos
estudos. Talvez ele nem fizesse idéia do quanto ele me influenciou para o meu
gosto pela leitura, ou talvez sempre soubesse em seu íntimo.
Outro dia eu
vi em uma livraria um cartaz com a seguinte frase de Bill Gates: “Claro que
meus filhos terão computadores, mas antes terão livros”. Acho que ele deve ter
tido um tio como o meu.
Penso que a
melhor maneira de agradecer-lhe, é partilhando essa narrativa, para que outros
tios que hora lêem estas poucas palavras, façam como ele: desafiem seus
pequenos a ler.
Arnaldo Martinez de Bacco
Junior
LEITURA PELOS OUVIDOS
Na
casa em que morávamos na usina de açúcar em que meu pai trabalhava, na qual
passei a minha primeira infância, havia na cozinha, um velho fogão de lenha
coberto por uma camada de cimento misturada a uma pigmentação em pó, cujo efeito
era popularmente chamado de “vermelhão”, que minha mãe mantinha sempre limpinho
e encerado.
Embora
minha mãe fizesse pouco uso deste fogão, sua presença na cozinha dava a ela,
certo ar de imponência e encantamento. A cozinha era o espaço mais solene da
casa, até mais que a sala de visitas, da qual, aliás, pouco me lembro.
Havia
também na cozinha, uma bela cristaleira de jacarandá, onde minha mãe guardava
alguns de seus maiores tesouros, que eram seus copos decorados e suas tigelas
de louça, além da fruteira de cristal e da compoteira que ela fazia questão de
manter sempre cheia de queijadinha, pé-de-moleque ou doce de leite com côco,
que ela fazia com tanto carinho e cujos sabores jamais provei igual.
Outro
objeto sacralizado da cozinha, disposto no alto de uma cantoneira, em frente ao
fogão de lenha, era o velho rádio valvulado, feito em madeira clara com botões
em madrepérola e auto-falante envolto numa palha leve, pelo qual o mundo da
informação e do entretenimento penetrava em nossa casa. E foi por ele também
que encontrei pela primeira vez com Christian Andersen, La Fontaine, Irmãos
Grimm e outros autores, através do programa do Vovô Jeremias que ia ao ar todas
as tardes, logo depois do almoço. Minha imaginação voava ao sabor daquelas
histórias e contos, acompanhados pelos doces de minha mãe e que tão
profundamente marcaram minha memória. A cigarra e a formiga, A roupa nova do
Rei, Festa no céu, Os quatro heróis, O flautista mágico, Ali Babá e os quarenta
ladrões, Simbad o marujo... Depois, quando nos mudamos da Usina para a cidade e
entrei na escola, vieram os livros. Mas o meu primeiro contato com o universo
da fantasia, com a maravilha da palavra escrita, foi pelos ouvidos. Muitas
vezes pelas histórias que minha mãe sempre me contava antes de dormir e outras
tantas pela magia do rádio
Não sei
afirmar ao certo, mas penso que programas como o do Vovô Jeremias não existem
mais. Alguém poderá dizer: - Ah, mas hoje os tempos são outros. Temos a
televisão, vivemos neste momento, a era da imagem. De fato, temos a televisão,
onde com raras exceções, há muita imagem, muita cor e pouco conteúdo, mas não
estou discutindo desenhos animados ou programação televisiva, estou falando de
narrativas, da força da palavra escrita, de leitura, de imaginação. Coisas que a
televisão, na maioria das vezes, não contempla, mas isso é outra discussão.
Já escrevi
antes sobre a importância do contar de histórias para as crianças, um hábito
tão saudável que hoje sinto que está se perdendo, assim como outros hábitos
familiares que têm desaparecido diante da imperiosa velocidade a que temos nos
submetido. Às vezes é preciso para um pouco e repensar nossos valores.
A magia do rádio só funcionava porque minha
mãe estava ali do meu lado e depois, à noite, repetia docemente as histórias na
cabeceira de minha cama. É disso que estou falando. Televisão, DVDs, sites de
historinhas, toda essa tecnologia é muito bem vinda, mas não substitui o calor
humano. Aliás, elas só fazem sentido se estivermos juntos de nossos filhos,
passeando pelos sites, assistindo com eles os seus desenhos favoritos ou
folheando com eles os livros que tanto gostam. Carinho, afeto, amor. Agindo
desse modo, não apenas incentivamos a imaginação de nossas crianças, como
também as fazemos mais seguras e confiantes por se sentirem amadas, evitando
milhões de dissabores futuros. Pensemos juntos nisso.
Arnaldo Martinez de Bacco
Junior
TORRÕES
DE AÇUCAR
Já disse algumas vezes que quando era criança, ainda em
minha primeira infância, morei com meus pais em uma usina de açúcar. Penso que
essas lembranças, ainda que distantes, são tão vivas em minha mente, porque de
algum modo fizeram parte de um tempo que foi bom, um tempo doce e que por isso,
ficou tão marcado na memória.
Meus primos continuaram morando por lá, depois meu pai foi
transferido para outro departamento, o que nos obrigou a mudar para a cidade.
Há algum tempo atrás, reunidos em uma dessas festinhas familiares, começamos a
puxar o fio da memória e relembramos saudosistas de algumas passagens
significativas desse tempo de crianças de usina. Depois de muitas histórias,
aventuras e cicatrizes espalhadas pelos joelhos e orgulhosamente exibidas pelos
narradores, um de meus primos exclamou interrogativamente: __ E os torrões de
açúcar? Foi aquele hummm... coletivo se espalhando pela sala. Foi como se
sentíssemos ao mesmo tempo, aquela guloseima ainda quentinha e disforme,
desmanchando-se em nossas bocas infantis. A história dos torrões de açúcar está
ligada a uma tarefa que para muitos meninos parecia indesejosa. Todos os dias,
na melhor hora de nossas brincadeiras, a mãe de um dos meus primos o chamava
para levar o almoço para seu pai que trabalhava no cozimento do açúcar.
Solidariedade de meninos, lá iam eles, todos juntos. Quando então chegava a
sexta-feira, a obrigação virava diversão.É que o pai do garoto, dava-lhes
torrões, quantos conseguissem segurar em suas pequeninas mãos, que deleitosamente
sorviam debaixo de frondosa árvore que existia em frente ao prédio no qual se
fabricava o açúcar. Para eles, aqueles torrões de açúcar eram o reconhecimento
pelo esforço de deixar as brincadeiras e caminhar sob o sol das onze horas
todos os dias, para levar o almoço.
Somos assim, como aqueles garotos. Gostamos de torrões de
açúcar. Gostamos de ter nosso trabalho reconhecido, de sermos elogiados quando
fazemos algo de bom, quando cumprimos com nossas obrigações satisfatoriamente.
E não me refiro a reconhecimentos via bolso. Alunos também gostam de torrões de
açúcar. Gostam muito e também não estou falando de notas. Refiro-me a um
carinhoso “parabéns” no caderninho, a um bilhetinho no canto da folha de
tarefas, a uma fala elogiosa para os pais. Aliás, chamar os pais na escola para
falar bem dos filhos deveria ser uma prática muito maior do que chamá-los para
advertências costumeiras. Reconhecimento do trabalho dos professores na sala de
aula por parte de diretores, coordenadores e supervisores também seria um bom
início para a retomada da auto-estima dos educadores. Torrões de açúcar.
Espalhados aos montes, tanto quanto as mãos de quem os recebe possam suportar,
tornariam a escola muito mais doce, como doce deve ser o ato de ensinar.
BACCO JÚNIOR, Arnaldo
Martinez. União dos Escritores Independentes de Ribeirão Preto. WWW.portaldasartes.com.br,
2005.
TRAMELAS
Quando garoto, depois que
nos mudamos para a cidade, de vez em quando eu ia com meus pais visitar alguns
tios e amigos que moravam em uma usina de açúcar aqui da região.
Era a usina para onde
meus pais se mudaram logo que eu nasci. Portanto, foi lá que eu passei os meus
primeiros anos cujas lembranças passeiam pela minha memória um pouco desconexas
às vezes e em outras, bem vívidas como neste momento em que aqui as descrevo.
Lembro-me das casas
branquinhas que ficavam dispostas de frente para uma imensa plantação de
eucaliptos de onde no final da tarde, exalava um perfume tão suave que ainda
hoje sou capaz de senti-lo.
Chamávamos aquele lugar
de Colônia. Ali moravam as pessoas que, como os meus pais, trabalhavam na
usina. Gente que trabalhava no plantio e corte da cana, na lida com o fabrico
do açúcar, no transporte, no escritório, no armazém, enfim, em todas as
atividades necessárias à produção do “ouro branco”. Durante os seis anos em que
lá moramos, minha mãe costurava para ajudar no orçamento da casa, enquanto meu
pai trabalhava na gráfica e, juntamente com seu compadre, dirigia o time de
futebol e cuidava da sede social da usina. Talvez por isso eles fossem tão
populares e queridos, mesmo depois de se mudarem de lá.
Pensando nas casas da
colônia, vêm à minha memória os galinheiros onde eu brincava, a horta que havia
no fundo de casa, a leveza da água tirada da cisterna, o cheiro do pão caseiro
feito no fogão de lenha. Sabores da infância. Lembro-me também das portas e
janelas de casa. Nelas não havia fechaduras. Só era possível trancá-las usando
uma trava de madeira chamada tramela que era posta de uma extremidade a outra
da porta ou da janela, pelo lado de dentro.
Ao lembrar-me das tramelas
que existiam na casa de meus pais, fico pensando nas tramelas que nós
inventamos em nossos corações. Trancamo-nos por dentro em relação às outras
pessoas. O saber daqueles com quem nos relacionamos, não nos interessa.
Assumimos uma posição egocêntrica na qual não se apresenta nenhum esforço no
sentido de ampliar a compreensão do outro. Só a nossa fala é que vale. Só o
nosso saber é portador da verdade civilizatória.
Agimos, às vezes
inconscientemente, tal qual agiram os colonizadores que se negaram a
compreender os nativos habitantes dos territórios conquistados e os dizimaram
sem piedade. Quanto saber, quanta cultura, quanta ciência desapareceu, sem que
outros povos sequer tomassem conhecimento de sua existência. Tudo porque
simplesmente negou-se o compreender do outro. Compreender o outro, é
compreender-se a si mesmo refletido no seu diferente. No entanto, nos negamos a
compreender o outro e alimentamos desse modo, a intolerância.
Muito me preocupa que as
escolas têm se ocupado tanto em educar para compreender as técnicas de
comunicação, para compreender a álgebra, a ciência ou os fatos da história, mas
não têm se dedicado, de um modo generalizado, a educar para a compreensão entre
os seres humanos na prática, embora esta falácia conste da maioria dos Projetos
Políticos Pedagógicos. Enquanto isso, milhões de programas são elaborados para
tentar diminuir a violência e o desrespeito que dominam o universo juvenil, mas
sempre, de um modo geral, a partir da ótica dos que nunca vivenciaram as
situações vividas pela maior parte dos jovens aos quais se destinam estes tais
programas e que por isso, acabam sendo ineficazes.
O educador Edgar Morin
elenca o ensino da compreensão humana como um dos sete saberes necessários à
educação do futuro.
A educação para a
compreensão não é tarefa fácil. Exige empatia, ver o mundo com os olhos do
outro, sentir como o outro, colocar-se na pele do outro. Exige compreender o
ódio e o desrespeito, exige compreender como se dá a incompreensão no outro.
Educar para a compreensão é despir-se de nosso eu antes de proceder a acusações
e julgamentos. Só assim poderemos argumentar com solidez e autoridade, sobre
cultura de valores.
Quanto aos conteúdos
operacionais que tanto preocupam muitos educadores que entendem a educação como
o ato de passar os conteúdos acadêmicos de suas especialidades e que se queixam
muitas vezes do desinteresse dos alunos em absorvê-los, tenho plena convicção
que ao trabalhar a compreensão humana, o eu no outro e com o outro, este
aprendizado se encarregará, certamente, de destrancar as tramelas que por
ventura impeçam o entendimento de outros saberes.
Arnaldo Martinez de
Bacco Junior
ARAPUCAS
Gosto
muito de histórias de meninos. Elas nos mostram lições interessantes, na
maioria das vezes.
Meu
pai sempre nos conta de suas traquinagens quando criança. E ele era um menino
realmente peralta.
Criado
em uma fazenda de uma das pequenas cidades aqui da região, ele desfrutou de uma
vida muito livre, em contato permanente com a natureza. Aprendeu a nadar no
riacho imitando o Tarzã, seu herói favorito das matinês de domingo que ele
assistia depois de ganhar alguns trocados engraxando sapatos na praça central
da tal cidade, para onde todos se dirigiam aos finais de semana. Jogou pião, brincou
com bolinhas de gude, colecionou figurinhas e botões de times de futebol e
também aprendeu a fazer estilingues e arapucas.
Em
suas incursões pela mata da fazenda adentro, uma de suas diversões era, como
todos os meninos de sua época de garoto, caçar passarinhos.
Para
tanto, o meu pai se tornou um exímio construtor das tais arapucas, armadilhas
feitas de paus trançados que formavam uma pequena caixa suspensa por uma
varetinha que por sua vez era presa a um barbante comprido. Sob a arapuca,
colocavam-se alguns grãos de arroz ou quirera de milho. Quando o passarinho
baixava de seu vôo para comer a isca, puxava-se o barbante, prendendo-o dentro
da arapuca, de onde era retirado em seguida e colocado em uma gaiola. Ao
perceber que estava preso, o pobre bichinho se debatia desesperadamente,
tentando em vão escapulir para a liberdade do céu aberto. Depois de muito
tentar, aquietava-se amuado em um canto da gaiola.
Meu
pai, ainda menino, foi percebendo que aquela diversão na verdade traduzia-se em
uma crueldade com os pássaros, que eram muito mais belos voando livres e
cantando do alto de seus ninhos. Assim, ele trocou a caça pela simples
observação, aprendendo depois a assobiar vários cantos diferentes de
passarinhos, que até hoje ele imita para a diversão das crianças de casa.
Às
vezes eu fico observando a escola e as crianças dentro dela. Observo quando
chegam quietas e noto a algazarra alegre delas quando vão embora. Dia após dia.
É como se a Escola fosse uma imensa arapuca.
Atrai as crianças com merendas e outros benefícios como os tais cartões sociais
e as apanham. Afinal, como diz a lei, lugar de criança é na escola. Mas na
escola a criança não consegue ser feliz. Como um pássaro preso na gaiola, ela
se debate, se rebela,fala mal, agride, fica mal comportada, destrói o
patrimônio público, torna-se um problema. Mas a lei é clara: Escola para todos!
Mesmo para os que não querem. E a essa altura não importa saber o porquê não
querem. Não é problema da lei. O professor é que tem que dar um jeito de fazer
com que aquela criança, mesmo contra sua vontade, aprenda. Justo ele, o
professor, que há muito tempo já não sabe mais como é voar, como é estar fora da
arapuca da sobrevivência que o sufoca anos a fio sem que ele se aperceba. E há
o conteúdo programático que não pode ser alterado, ainda que a criança nunca
fará uso deles em sua vida, sobretudo hoje em dia em que a escola deixou de ser
a única detentora de conhecimentos; a papelada da burocracia, os diários de
classe e os relatórios que provavelmente ninguém vai ler; a dupla jornada e os
acúmulos de cargo para que se possa obter um salário razoável; os projetos que
“caem” de cima para baixo e que é preciso executá-los de qualquer maneira; as
intermináveis reuniões pedagógicas que quase sempre discutem textos que
esculhabam com o professor e, para piorar ainda mais a situação, tem as leis de
agora que protegem principalmente os “maus” alunos e que leva muitos a desabafarem
dizendo que não se formaram para serem babás de marmanjos.
Mas nada disso
importa, pois a lei está sendo cumprida, as autoridades estão satisfeitas e as famílias
beneficiadas.
Educação não
pode ser por obrigação. Tem que ser pelo prazer tanto de aprender, quanto de
ensinar. As intenções das leis são boas e por isso, bem vindas, mas é preciso
repensar urgentemente alguns conceitos como obrigatoriedade do ensino, papel da
escola, da família, da sociedade e das autoridades, conteúdos programáticos, respeito
mútuo, funções dos alunos e dos professores e em alguns casos, até o conceito
de profissão de mestre-escola, para que a Escola deixe de ser uma arapuca e se
transforme em uma floresta harmoniosa, agraciada pela alegria do canto e do vôo
dos pássaros.
Arnaldo Martinez de Bacco Jr.
BIBLIOGRAFIA
Outro
dia desses, meu pai resolveu fazer um passeio diferente. Tive o privilégio de,
em sua companhia, visitar o lugar onde ele nasceu. Começamos pelo local onde
ficava a casa em que a família de meu avô morou. Por ser funcionário da Companhia
Mogiana de Estrada de Ferro, meu avô morava em uma casa da empresa que ficava
do lado da linha do trem, àquela época, bem retirada da cidade. Hoje a casa não
existe mais. Foi demolida por razões técnicas, coisas da urbanização. Dalí
fomos para a antiga estação ferroviária, hoje transformada em um precário aparelho
social. Andamos por algumas ruas, percorremos o centro velho, passamos pela
escola em que ele estudou, momento em que saudoso, contou-me como eram seus
professores e como ele era enquanto aluno. Chegamos até a Praça da Matriz, onde
meu pai engraxou muito sapato para ganhar alguns trocados e assim assistir as aventuras
de seus heróis favoritos nas matinês do cinema que não existe mais. Olhei nos
olhos de meu pai e pude ver através deles Tarzan, Flash Gordon, Rin Tin Tin,
Roy Roggers e seu inseparável cavalo Tigers, e tantos outros personagens que
por muito tempo povoaram a fantasia dele de seus amigos de infância. Fomos ao
campo de futebol, hoje transformado em um frigorífico desativado, mas ainda
vívido na memória de meu pai. Voltamos para a década de mil novecentos e
quarenta. Conheci alguns de seus amigos, lamentei com ele o passamento de
muitos deles, ouvi histórias de futebol, de travessuras e de disputas
eleitorais, já que meu pai trabalhava na tipografia do jornal da cidade e desde
muito cedo se envolveu no fascinante mundo da política, quando essa era uma
atividade romântica. Absorvi intensamente a releitura daquela tarde memorável,
na qual muito aprendi partilhando das lembranças de meu amado pai.
Ás
vezes sou convidado a falar em algumas escolas, o que para mim é ao mesmo tempo
honroso e desafiante. Numa dessas falas em que o assunto era sobre a
necessidade de se fazer da rotina algo novo e surpreendente, uma das pessoas
que educadamente me ouviam, perguntou-me sobre a bibliografia que eu pudesse
indicar sobre o tema. Nesse momento, lembrei-me da viagem no tempo que fiz com
meu pai. Respondi então que a melhor bibliografia para aquele momento seria
fazer a releitura de nós mesmos. Reler nossa vivência como alunos, o que
esperávamos da sala de aula, o que nos repelia e principalmente o que nos
encantava. Reler nossa experiência como regentes de sala, reler as mensagens
que os alunos tem nos mandado durante todo o tempo.
Isso
vale não só para a sala de aula, mas para outras circunstâncias de nossas
vidas. Num tempo em que a leitura é tão acessível, que a livrarias estão
abarrotadas de obras sobre os mais diversos assuntos, algumas de excelente
qualidade, é importante adquirir uma boa bagagem intelectual, pois a leitura
nos dá conhecimento e segurança, não há dúvidas. Mas muito mais que ler bons
livros, precisamos aprender a ler a nós mesmos, aprender com o que vivenciamos
de bom ou de ruim, fazendo crescer nossa alma para que, como afirmou Pessoa,
tudo possa valer a pena.
MANIFESTO ECO
LÓGICO
PAINA DE ALGODÃO NO
AZUL CELESTE
AR VO RE
AR
AR
AR
AR
AR
VO
E
ASFIXIA
A
A
A
A
A
A
A
AR
BR
PE TRO BRAS
PE TRO BRAS
PE TRO BRAS
PE TRO BRAS
PE TRO BRAS
ES PEC TRO
BRAS
S.O.S.
ALGUÉM SALVE A SELVA
ALGUÉM SALVE A RELVA
ALGUÉM SALVE OS BICHOS
ALGUÉM SALVE OS NICHOS
ALGUÉM SALVE AS BALEIAS
ALGUÉM SALVE AS SEREIAS
ALGUÉM SALVE ALGUÉM
ALGUÉM SALVE O QUE QUISER
NINGUÉM SALVA NINGUÉM
ALGUEM SALVE
SALVE-SE
QUEM
PUDER!
CÉUS...
CÉU
CÉU AZUL
AZUL ESCURO
ESCURO
ESCURO
MAIS ESCURO
CADA VEZ MAIS
ESCURO
CÉUS...
CADÊ
O AR
PURO?
MACHADO
UM OCO RUÍDO
FAZ
UM TOCO CAÍDO
JAZ.
CHUVA
CHAMA
CHAMINÉ
CHAMA A
NUVEM
DIÓXIDOCARBONÁRIA
INCENDIÁRIA
CHUVA
ÁCIDA
CHUVA
CHUVA
CHUVA CHOVENXOFRE
CHUVA SOFRE
CHUVA
ÁCIDA...
SOL
BRISA
ANTINTESE
CLOROFILA FOTOSINTESE
CHUVA
CHUVA
CHUVA
CHUVA PLÁCIDA
EXTINÇÃO
BICHO NA JAULA
PASSARINHO NA GAIOLA
HOMEM NO APARTAMENTO;
GATO NA COLEIRA
CACHORRO NA FOCINHEIRA
HOMEM NO CONGESTIONAMENTO;
BOI NO MATADOURO
OVELHA NO TOSQUIADOURO
HOMEM NO CONFINAMENTO;
RATO NA ARMADILHA
ANIMAL NA PONTA DA MIRA
HOMEM NO SEU PENSAMENTO...
ALGUÉM ME DIGA, ONDE FICA A SAÍDA?
ARNALDO
MARTINEZ DE BACCO JUNIOR
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