história, quadrinhos & CIA.
domingo, 14 de junho de 2015
sábado, 13 de junho de 2015
OMISSÃO
Li no jornal
Que dezesseis ianomâmis
Foram chacinados
No mesmo dia em que à noite
Alguns meninos foram executados
Na mesma semana em que numa favela
Moradores foram assassinados
No mesmo mês em que o New York Times
Noticiou nossos bosques incendiados
Na mesma hora em que neguei três vezes
A um menino, alguns trocados.
COLETIVO
Noite dessas entrei
Em um ônibus lotado
Pessoas, marmitas,
Mochilas por todo lado
Cansaço e melancolia
Nos olhos daquela gente
Era o que se via...
Pensei sobre o assunto
Para escrever poesia
Mas pobreza não dá rima:
Pobreza dá é agonia!
CRÁS
Um beijo de vidro
Atravessa a praça
E se estilhaça
Contra a vidraça.
Desastrevidro
Atrevido
Beijo fatal
Amor tecido
De cristal.
CELESTIA
Estrela
Que estraçalha
O espaço...
Navalha
Fio de aço,
Reluz
No céu
Um açoite...
Enquanto isso
À anos luz
No sul
De um continente
De um planeta azul,
Incontinentes
Os homens se escondem
Com medo da noite.
ARMAGEDON
FELIZ ANIVERBOLO
ANIVERSARIA
OUTRO MILHANO
PLANETERIA.
NÃO FOSSE
O NEANDERTOLO
OGIVORGIA
HOMO LUPUS
BESTA FERA
RUBROTÃO
ATMOSFERIDA.
TÉDIO
A hora...passa
O dia... passa
O mês... passa
O ano... passa
Passa a vida,
Passageiro
Da agonia..
A DIREÇÃO
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Siga a seta
Cega seta.
ESTOJO AZUL E BRANCO
Perto de casa havia um armazém que
vendia de tudo. Esses armazéns, conhecidos como “vendas”, eram muito comuns. Lembro
que tinham geralmente um cheiro forte de temperos exóticos, misturados a aromas
mais adocicados. Sobre o balcão, estampavam-se os varais nos quais se
penduravam queijos salames defumados, lingüiças e carne seca. Aos arredores,
sacos de cereais que eram vendidos a granel, pesados e colocados em pequenos
sacos de papel pardo. Também o óleo era vendido em litros, colocados em
garrafas de vidro por meio de uma maquininha que funcionava com uma alavanca
que impulsionava o liquido por um caninho até à abertura da garrafa, desenhando
um espetáculo à parte para os olhos curiosos de criança. No balcão ficavam
expostos os famosos doces de pé-de-moleque, maria-mole, coração-de-abóbora,
canudinho de leite, sem falar nos sonhos e pudins de farinha e leite, os tais
“pudins de padaria”. Só de lembrar desses sabores da infância, minha boca se
enche d’água.
Nas vendas, não havia apenas gêneros
alimentícios, mas também aviamentos, botinas, regadores, enxadas, chapéus, fumo
de corda, canivetes, caldeirões, caçarolas, cortes de fazenda (que era como se
chamavam os tecidos) e artigos de época, entre outras coisas. Tudo na base da
caderneta. A palavra dada valia ouro e o acerto no final do mês era sagrado.
Foi numa dessas vendas que minha mãe
comprou o meu primeiro material escolar. Ainda trago na memória o dia em que
fui com ela para comprá-lo. Um caderno brochura que trazia no verso a letra do
hino nacional e o desenho de nossa bandeira, uma caixinha de seis lápis de cor
com um soldadinho estampado na embalagem alaranjada, um lápis preto, um lápis
vermelho, uma borracha e um apontador. Muito caprichosa, porém, ela ainda comprou
um estojo plástico azul e branco, com tampa sanfonada. Para mim, aquele
material tinha um valor inestimável. Hoje mais ainda, quando penso no quanto
deve ter sido custoso, naqueles dias de poucas posses, ainda mais quando me lembro
da bolsa em forma de pasta, preta, com presilhas prateadas que ela me trouxe da
“cidade”, que era como nos referíamos ao centro comercial.
Lembro disso hoje, quando as
papelarias e hipermercados expõem infinitos modelos de fichários e cadernos
perfumados, acolchoados, com os heróis e ídolos da moda estampados em suas
capas, mochilas dos mais variados modelos, canetas dos mais variados tipos,
lápis de todas as cores, borrachas de todos os formatos, enfim, uma variedade
tão imensa que os olhos até se perdem. Apaixonado que sou por tudo o que possibilite
a escrita e o aprender, penso que seja até saudável que haja tantas opções para
estimular as crianças a irem para a escola. No entanto, fico pensando em
algumas situações que também devem ser levadas em consideração.
Não vou nem discutir os custos
desses materiais diferenciados e a falta de acesso a eles por boa parte das
crianças que freqüentam as escolas públicas, por exemplo, e que dependem do
material doado pelo Estado para continuar freqüentando a escola. Aliás, penso
que o governo não deveria doar materiais e livros aos milhões como tem sido
feito, mas propiciar aos pais dessas crianças a possibilidade de ganho digno
por meio do trabalho para comprarem o que melhor lhes conviesse.
Tudo o que se refere à escola tem que ter, a meu ver, um caráter
educativo, inclusive a compra do material escolar. Lembremo-nos disso e não
percamos a oportunidade de discutir com nossos filhos sobre a importância da
leitura do mundo e, conseqüentemente, do consumo ético e consciente. Valerá a
pena, certamente.
Arnaldo Martinez de Bacco Junior
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