sábado, 13 de junho de 2015

TORRÕES DE AÇUCAR
Já disse algumas vezes que quando era criança, ainda em minha primeira infância, morei com meus pais em uma usina de açúcar. Penso que essas lembranças, ainda que distantes, são tão vivas em minha mente, porque de algum modo fizeram parte de um tempo que foi bom, um tempo doce e que por isso, ficou tão marcado na memória.
Meus primos continuaram morando por lá, depois meu pai foi transferido para outro departamento, o que nos obrigou a mudar para a cidade. Há algum tempo atrás, reunidos em uma dessas festinhas familiares, começamos a puxar o fio da memória e relembramos saudosistas de algumas passagens significativas desse tempo de crianças de usina. Depois de muitas histórias, aventuras e cicatrizes espalhadas pelos joelhos e orgulhosamente exibidas pelos narradores, um de meus primos exclamou interrogativamente: __ E os torrões de açúcar? Foi aquele hummm... coletivo se espalhando pela sala. Foi como se sentíssemos ao mesmo tempo, aquela guloseima ainda quentinha e disforme, desmanchando-se em nossas bocas infantis. A história dos torrões de açúcar está ligada a uma tarefa que para muitos meninos parecia indesejosa. Todos os dias, na melhor hora de nossas brincadeiras, a mãe de um dos meus primos o chamava para levar o almoço para seu pai que trabalhava no cozimento do açúcar. Solidariedade de meninos, lá iam eles, todos juntos. Quando então chegava a sexta-feira, a obrigação virava diversão.É que o pai do garoto, dava-lhes torrões, quantos conseguissem segurar em suas pequeninas mãos, que deleitosamente sorviam debaixo de frondosa árvore que existia em frente ao prédio no qual se fabricava o açúcar. Para eles, aqueles torrões de açúcar eram o reconhecimento pelo esforço de deixar as brincadeiras e caminhar sob o sol das onze horas todos os dias, para levar o almoço.
Somos assim, como aqueles garotos. Gostamos de torrões de açúcar. Gostamos de ter nosso trabalho reconhecido, de sermos elogiados quando fazemos algo de bom, quando cumprimos com nossas obrigações satisfatoriamente. E não me refiro a reconhecimentos via bolso. Alunos também gostam de torrões de açúcar. Gostam muito e também não estou falando de notas. Refiro-me a um carinhoso “parabéns” no caderninho, a um bilhetinho no canto da folha de tarefas, a uma fala elogiosa para os pais. Aliás, chamar os pais na escola para falar bem dos filhos deveria ser uma prática muito maior do que chamá-los para advertências costumeiras. Reconhecimento do trabalho dos professores na sala de aula por parte de diretores, coordenadores e supervisores também seria um bom início para a retomada da auto-estima dos educadores. Torrões de açúcar. Espalhados aos montes, tanto quanto as mãos de quem os recebe possam suportar, tornariam a escola muito mais doce, como doce deve ser o ato de ensinar.

BACCO JÚNIOR, Arnaldo Martinez. União dos Escritores Independentes de Ribeirão Preto. WWW.portaldasartes.com.br, 2005. 

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