Já disse algumas vezes que quando era criança, ainda em
minha primeira infância, morei com meus pais em uma usina de açúcar. Penso que
essas lembranças, ainda que distantes, são tão vivas em minha mente, porque de
algum modo fizeram parte de um tempo que foi bom, um tempo doce e que por isso,
ficou tão marcado na memória.
Meus primos continuaram morando por lá, depois meu pai foi
transferido para outro departamento, o que nos obrigou a mudar para a cidade.
Há algum tempo atrás, reunidos em uma dessas festinhas familiares, começamos a
puxar o fio da memória e relembramos saudosistas de algumas passagens
significativas desse tempo de crianças de usina. Depois de muitas histórias,
aventuras e cicatrizes espalhadas pelos joelhos e orgulhosamente exibidas pelos
narradores, um de meus primos exclamou interrogativamente: __ E os torrões de
açúcar? Foi aquele hummm... coletivo se espalhando pela sala. Foi como se
sentíssemos ao mesmo tempo, aquela guloseima ainda quentinha e disforme,
desmanchando-se em nossas bocas infantis. A história dos torrões de açúcar está
ligada a uma tarefa que para muitos meninos parecia indesejosa. Todos os dias,
na melhor hora de nossas brincadeiras, a mãe de um dos meus primos o chamava
para levar o almoço para seu pai que trabalhava no cozimento do açúcar.
Solidariedade de meninos, lá iam eles, todos juntos. Quando então chegava a
sexta-feira, a obrigação virava diversão.É que o pai do garoto, dava-lhes
torrões, quantos conseguissem segurar em suas pequeninas mãos, que deleitosamente
sorviam debaixo de frondosa árvore que existia em frente ao prédio no qual se
fabricava o açúcar. Para eles, aqueles torrões de açúcar eram o reconhecimento
pelo esforço de deixar as brincadeiras e caminhar sob o sol das onze horas
todos os dias, para levar o almoço.
Somos assim, como aqueles garotos. Gostamos de torrões de
açúcar. Gostamos de ter nosso trabalho reconhecido, de sermos elogiados quando
fazemos algo de bom, quando cumprimos com nossas obrigações satisfatoriamente.
E não me refiro a reconhecimentos via bolso. Alunos também gostam de torrões de
açúcar. Gostam muito e também não estou falando de notas. Refiro-me a um
carinhoso “parabéns” no caderninho, a um bilhetinho no canto da folha de
tarefas, a uma fala elogiosa para os pais. Aliás, chamar os pais na escola para
falar bem dos filhos deveria ser uma prática muito maior do que chamá-los para
advertências costumeiras. Reconhecimento do trabalho dos professores na sala de
aula por parte de diretores, coordenadores e supervisores também seria um bom
início para a retomada da auto-estima dos educadores. Torrões de açúcar.
Espalhados aos montes, tanto quanto as mãos de quem os recebe possam suportar,
tornariam a escola muito mais doce, como doce deve ser o ato de ensinar.
BACCO JÚNIOR, Arnaldo
Martinez. União dos Escritores Independentes de Ribeirão Preto. WWW.portaldasartes.com.br,
2005.
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